quarta-feira, 27 de julho de 2011

Não te peço apenas...

Não te peço apenas que veja,
mas que não me esqueça de que tenho olhos.

Não te peço apenas pés para caminhos trilhar,
mas que não me esqueça de que os posso movimentar.

Não te peço apenas as palavras para dizer,
mas que não me esqueça de que tenho boca para as pronunciar.

Não te peço apenas a força para agarrar,
mas que não me esqueça de que tenho as mãos trabalhar.

Não te peço apenas para crescer,
mas que não esqueça de que eu ja estou a ser.

quarta-feira, 11 de maio de 2011

Que as pedras se quebrem!

Que as pedras se quebrem

diante do Sopro suave

que do Alto cai em gotas de sangue

na dureza da superficialidade.


Que as pedras se fendam

e se colmatem do húmus

e nelas brote a vida

que nelas cai.


Que as pedras se abram

e as trevas se iluminem

na transparência revelante

da rugosidade crua e pura

da verdade carente assumida

na Verdade vivente e doada.

sábado, 23 de abril de 2011

Detiveram-se 'calados' os nossos passos

"Detiveram-se os nossos passos, às tuas portas Jerusalém..."

A atitude de estupefação diante de um evento surpreendente deixa geralmente o homem em atitude de abrandamento de ritmos, paragem contemplativa, ... diante de um Belo calam-se geralmente os ritmos acelerados, numa lentidão de passos para permitir que a percepção se sacie e se deixe revolver e extasiar no que a transcende.

Dizia Wittgenstein que sobre que "aquilo que não se pode falar, deve-se calar". O filósofo aqui tem quase razão - o que nos transcende é maior do que a nossa linguagem; de facto, quando falamos de algo que é maior do que nós, todas as nossas afirmações são heréticas - são heréticas por sempre truncarem parte de um dado maior nos limites da afirmação quer linguística, quer existencial. Sócrates, o grego, teve esta mesma consciência - por isso apelou à humildade como condição que para que o conhecimento possa crescer. Só quem se coloca na atitude de querer dominar o que o transcende é que pode pretender assim afirmar dono da Verdade.

Mas também como é que se nos dada a percepção do transcendente, nos temos depois de nos remeter a um silêncio castrante, e deixar a nossa existência hermética diante de um transcendente?! A tradição católica designa esta atitude de Temor de Deus. Então, não será que o surgimento do Belo diante da percepção limitada do homem não haverá de marcar a consciência do homem com a Esperança na reverância que o sustente na sua acção?!

Dostoievsky dizia que a Beleza salvará o mundo. Tem razão. A Beleza que não será apenas a dos altos muros erguidos, ou dos mais rebuscados pináculos góticos de uma titânica catedral, mas aquela que está presente no rosto de cada um. É na dignidade da pessoa que a beleza resplandece de mais nítida. Mas pode um rosto ferido e desfigurado "deter os passos" apressados?

Pode. Pode quando nos percebemos que Aquele, de quem somos à Imagem, está no lugar que nos pertenceria - o de termos que sofrer pelo mal que nos flanqueia e que nós também flanquemos.
Pode. Pode vemos que o sofrimento faz também parte da nossa existência, e que esse mesmo sofrimento se torna também redentor dos homens por serem oportunidade abertas a perceber a contingência pessoal, que é atenuada no rosto de outro contingente.
Pode. Pode quando percebemos que o rosto mal-tratado se tornou vivo, numa abundância de vida que surpreende e que se tornou presente em cada um. Mas esse outro já não é contingente, mas sim Absoluto, e que o lugar que ocupa afinal existia em nós, ainda que nós não o sabessemos e não sabermos. Mas sabemos que ocupa. E por isso ficamos calados.

sexta-feira, 18 de março de 2011

Matéria Criada


- partícula de Highs Boson, a partícula de Deus, que o CERN procura -


O que é que nos leva ao conhecimento?
Este é um dos temas mais célebres da filosofia.
Esta sempre reflectiu sobre este fenómeno. E parece que quanto mais se investiga, mais se interroga. Como é que conhecemos? Algumas coisas me parecem certas. Todos acabamos, no meio da nossa finitude por ver as coisas de um determinado modo, que varia de pessoa para pessoa. Isto torna-se ainda mais evidente à medida que se estuda a história do pensamento ou quanto mais se viaja. É fácil perceber que o conceito metafísico de Ideia em Platão representava o expoente da realidade, na qual nada de sensível poderia habitar, até Kant que a considerava como um devaneio irresistível da razão e princípio heurístico da especulação, necessária para a formulação dos juízos. Ou então, a introdução do Zero na matemática, como conceito do vazio, o qual permitiu uma afinação da exactidão matemática. Mas até este ponto é interessante. É pelo facto de se introduzir um elemento metafísico na concretude dos cálculos matemáticos que estes conseguem descrever a realidade com maior exactidão. Mais uma vez se verifica que a referida "ciência exacta" é apenas um dinamismo de aproximação de uma realidade que a transcende, e que não a consegue abarcar.
Mas como conhecemos? O conhecimento existe e isso é um dado que não podemos pôr de parte, ainda que aconteça em nós de forma sempre imperfeita, e por isso sempre dinâmica.

A matriz da formação material tem de ter o mesmo princípio base onde possa ocorrer a sinergia entre o nosso pensamento e razão com o objecto onde nos deparamos. Estámos ligados a tudo, mas existe em nós, homens um salto ontológico de percepção da realidade, pela nossa própria auto-consciência.
Para a fé - e aqui já vimos que nem a melhor ciência exacta é assim tão exacta, mas no domínio estrito por si validamente definido - este Princípio é o Logos, no qual todas as coisas foram criadas e que marca a criação com a sua inteligibilidade. Mas se o Logos é perfeito, como podem as coisas criadas serem contingentes? Esta é batalha para outras núpcias... a qual não me irei escapar em próximo post.

quarta-feira, 2 de março de 2011

Mesmo apenas de um olhar positivista, a vida é algo que não pode deixar de fascinar. Mesmo do ponto de vista mais frio, interrogarmo-nos de como a matéria supera a acção de dinamismos de partículas para a ter capacidade de decidir, numa simbiose contingencial de vontade com o corpo e a vontade, é evento de expressão inefável.
Ainda assim, a vida corre o risco de ficar atolada em pântanos, lodos e areias movediças que podem paralisar a vontade. Aliás, todos vivemos momentos em que ficamos mergulhados na nossa subjectividade sem horizonte de esperança objectivável. Estas englobam geralmente ou sofrimentos alheios ou danos por terceiros. E se há situações que podem ser superadas graças à nossa força, aquelas que são realmente profundas requerem a presença do outro para auxiliar, ou então mesmo para ser resgatar. A necessidade de quem auxilie na dádiva da vida com sentido é pois fundamental, não para dar o que já se tem, mas para apontar para o que ainda se não é. E na descoberta da nossa contingência intuímos a necessidade de sermos completados por aquilo, ou melhor, pelo rosto de um tu diferente que nos faz mais completos.
Mas eis que o dilema acontece. A vida, a matéria consciente, deixa de ser consciente, pelo menos de forma aparente, num fenómeno que se chama morte. Ficamos frios. Mas pode-se matar a vontade, se o corpo permanece visível a nossos olhos? Digo-o assim: o meu grito pela transcendência de ser não pode ser satisfeito no regaço de alguém contingente. Não pode. E se alguém diz que sim é porque mente. Só a fonte de toda e qualquer transcendência pode realmente dar a vida em abundância, numa torrente forte, serena e surpreendente que transforma e nos sacia o desejo e nos faz ansiar por mais. Falo pois de Amor. É este mesmo Amor que alimenta quem decide abraçar o chão que outros pisam para ser símbolo do Amor que vive. Pois o amor faz gerar vida.

terça-feira, 28 de dezembro de 2010




Vem, ó Luz gerada na Luz
da santidade ofuscante e resplendente;
Vem iluminar e completar
as tuas criaturas,
vem desvelar o que somos
e completar a Tua imagem.

Vem Luz de Deus
e desperta-nos
dos sonos vazios e anestesiantes
que tolhem a nossa vontade
de percorrer os Teus caminhos.

Vem Luz, tecida no tear eterno,
vem unir o que está rasgado
no fogo cauterizador
da Tua Misericórdia,
e protege-nos com o Teu manto
dos ventos frígidos do egoísmo e da amargura,
para também sabermos ver em outro rosto
o Teu infante olhar de ternura.

quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

Entregue!


Corpo,
matéria viva
entregue no horizonte
[actual e futuro]
acolhido pela e na Luz que brilha no escuro
e que grita no silêncio.
Entregue, com as marcas do desejo,
carente e doado,
que ardem e iluminam e doem.
Mas entregue. Agora. Sempre.
Para levar a Luz e a acender,
Num trono de Cruz.